E há a história daquele homem-de-Deus, um santo, certamente, que estava mergulhado em profunda oração, quando de repente, um passarinho, tiritando de frio, se recolheu, morto de medo, junto a seus pés. Sem pensar duas vezes, abriu seu manto e aconchegou a mísera avezinha contra seu peito. Quase que incontinenti, chegou voando um gavião, esfalfado, resfolegando, que assim o censurou:
– Ah, não, homem-de-Deus! Este passarinho me pertence. Estou a persegui-lo há um bom tempo. Dele depende a minha sobrevivência.
O homem-de-Deus ficou atônito, sem saber o que faria: entregar o passarinho ou deixar morrer o gavião. Este argumentava e insistia:
– Foi Deus quem me fez assim, com este instinto de matar para viver. Não sou mau por causa disso. Dá-me o passarinho! Quero viver!
O homem-de-Deus compreendeu que era ou um ou outro. Seu coração compadeceu-se de ambos e ele propôs dar um pedaço de si para que o gavião não morresse e o passarinho pudesse viver.
E diz a estória que o homem-de-Deus trouxe uma balança com dois pratos, sobre um dos quais ele colocou o passarinho e, cortando um pedaço de si mesmo, colocou-o sobre o outro. Mas o fiel da balança quase não se moveu. O passarinho parecia muito mais pesado. Acrescentou um outro pedaço e mais outro, e os dois pratos ainda continuavam desequilibrados. Até que ele compreendeu que não era suficiente dar pedaços de si mesmo, mas era preciso dar-se por inteiro. Assim subiu todo ele no outro lado da balança que, então, equilibrou seus pratos.
Prossegue a estória dizendo que imediatamente o gavião desapareceu e, em seu lugar, apresentou-se Deus, que lhe disse:
© Muito bem, meu homem, homem-de-Deus! Queria saber se tu, que tanto me amas, também serias capaz de amar uma criatura minha, por mais pequenina que fosse, como este passarinho. Agora, todos podem chamar-te homem-de-Deus, porque não te negaste a ser homem-de-um-pobre-passarinho.
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